13 January 2011

Tempestade


"Olha, Eva, a esperança é mesmo estranha, muito estranha. Podes dar por ti um dia a passear no caminho, esperando encontrar aquele de quem gostas. Mas será que o consegues encontrar? Não. E porque não? Porque nessa manhã ele está ocupado e talvez até esteja noutro lado...

Certa ocasião tive a oportunidade de conhecer um velho lapão, no alto das montanhas. Ele nunca vira nada durante 58 anos e já passava dos 70, no momento do nosso encontro. Disse que tinha a sensação que a sua visão estava a melhorar a pouco e pouco, que estava a recuperá-la gradualmente, pelo menos assim pensava. Se tudo corresse bem, poderia voltar a distinguir o sol ao fim de poucos anos. O cabelo dele ainda era negro, mas tinha uns olhos muito brancos. Quando se sentou na sua cabana a fumar, falou acerca de todas as coisas que tinha visto antes de ficar cego. Era forte e destemido, sem sentimentos e indestrutível; manteve a esperança. Quando eu estava de partida, saiu comigo e começou a apontar para diversas direcções. "Ali é o sul", disse ele, "ali fica o norte. Segue primeiro naquela direcção e depois de desceres um pouco, vira para aquele lado". "Com certeza", disse eu. Então o lapão riu-se cheio de satisfação e afirmou: "Aí tens! Eu não sabia isto há 40 anos ou 50 anos atrás, por isso devo estar a ver melhor do que antes. Sim, estou sempre a melhorar". Depois agachou-se e esgueirou-se novamente para dentro da cabana, a mesma cabana de sempre, a morada dele na terra. Sentou-se diante da lareira como era costume, cheio de esperança de, após alguns anos, ser capaz de distinguir o sol novamente...

Eva, tudo o que se relaciona com a esperança é muito estranho. Aqui estou eu, por exemplo, esperando a todo o instante conseguir esquecer-me daquela com quem não me cruzei no caminho esta manhã..."

Knut Hamsun, Pan